POP E ANTI-POP: DUAS COISAS AUDÍVEIS EM MEIO AO CAOS E AO BONDE DO TIGRÃO.

1.A MÚSICA DE WIN METTERS – O SOM DO DESESPERO.

Quando você estiver doendo não coloque Win Metters na vitrola ou no cd do computador ou ainda na aparelhagem que tiver em casa. É que o som deste belga pode causar ainda maior dano a sua saúde mental. Não se trata de barulheira. Não se trata de problema de surdez. Não é nada disso que está pensando agora. Trata-se de música triste. Uma música que beira a clássica e já serviu de trilha para alguns filmes fúnebres. Se você achava que Janis Joplin era triste, era. Nem nenhum punk rock pode deixar alguém num estado de depressão tão profunda quando Metters. Ele toca um piano muitas vezes acompanhado de um sintetizador e uma soprano que não chega a ser uma Yma Sumac, mas alcança notas altíssimas e belas. Sem dúvida que para dias de desespero não é muito aconselhável – também não é apropriado ao distúrbio bipolar de humor. É perigoso ouvir o som do desespero.

Por outro lado, em dias quentes de verão enquanto a turma se acotovela.- ouvindo O Bonde do Tigrão rumo ao Piscinão de Ramos-, existe o desprazer do prazer de saber, com perdão da grande cacofonia, que ainda há música boa na face do globo terrestre. Nem que seja vindo da Bélgica. Nem que seja vinda de apenas um instrumento como muitas vezes um piano. Um piano belo e triste que ecoa no vazio e no interior, retinindo no âmago como se fosse o antídoto a facilidade.

Claro que o contato com as verdades ou com uma música de qualidade potencializadora é uma experiência. Sendo assim: nunca se volta o mesmo depois de ter escutado algo que é arte em dias que enfadam de tristeza – só que uma tristeza infértil e que constata e pergunta, onde estão músicos como Metters? Onde mora a música contemporânea? O que estão fazendo com os nossos ouvidos?

2.CÁSSIA ELLER – GOLD.

Quando um escritor é editado pelas Edições de Ouro, em livros de formato de bolso, é o melhor sinal de que está alçada a categoria de eterno. Assim também o é – na música -, quando o cantor passa a figurar em antologias como a Gold,da gravadora Universal. Este é o caso de Cássia Eleer. Depois de uma morte estranha onde a família agiu de forma igualmente estranha, ocultando ou contradizendo os fatos, é a hora de dar à estrela Cássia a parte que lhe cabe dentro do latifúndio da MPB e do roque Brasil. E creiam, há que ser muito generosos com a cantora de “Malandragem” – sem dúvida o último grande artista que o século passado ouviu e o primeiro que o início do século viu acabar existencialmente.

Claro que a obra é eterna. Renato Russo é eterno. Cazuza é eterno e Cássia será eterna – uma destas grandes criaturas que vieram ao mundo para detonar tudo, para abalar alicerces, e ela cantou no CD GOLD tudo aquilo que viveu e os seres que povoaram a sua existência: Cazuza, Renato Russo, Jhon Lennon, Kurt Cobain.

O Segundo Sol é o primeiro som que brilha na alvorada do CD Gold de Cássia Eller. A música foi composta pelo titã Nando Reis e anuncia o brilho efusivo que virá e já começa nesta iluminação de abertura. É um arranjo simples onde os violões estão em primeiro plano e a voz de Cássia soa tranqüila e sem a agressividade que virá posteriormente. Trata-se de uma balada suave à moda de Cássia. Na Cadência do Samba seguimos ouvindo o clássico de Ataulfo Alves, revisitado e mostrando o balacobaco e o caterefofo de nossa musa gay. Cazuza surge e brilha na voz da diva quando ela canta Todo Amor que Houver Nesta Vida. Ser o pão e ser a ferida. Todo o amor que houver nesta vida não e suficiente para amar Cássia. Malandragem vem com muita sacanagem e é o maior sucesso da cantora. Aqui ouvimos a versão antiga e não a que fez mais sucesso: a do acústico MTV. Mesmo assim Ela é Ela ou Ela é Ele. Pouco importa. Eu só peço a Deus um pouco de malandragem, pois eu sou criança e não conheço a Verdade. Segue uma versão ao vivo de Eu sou Neguinha, de Cae Veloso Chegamos ao ápice com Try a litle tenderness. Um puta soul maravilhoso, obra prima. Na voz de Cássia a canção ainda cresceu mais e é um momento inigualável na carreira da cantora. Preciso dizer que te amo, de Cazuza, vem a seguir deixando a interprete passear por ritmos mais calmos como a bossa nova. A Legião está presente em Música Urbana, uma canção muito chata, mas que na voz de Cássia fica estranha e dissonante. Ganha o ouvinte. Outra chatice de letra é Pro dia nascer feliz, que fica audível devido ao arranjo e a voz da cantora mais importante surgida no Brasil desde a morte de Elis Regina. Creio que o maior paralelo entre as duas está no fato de que ambas não sabiam da dimensão que tinham. Cássia ainda irá crescer muito. A versão para Smells like teen spirit é fraca e nada acrescenta a original: mesmo a gana da interprete não é suficiente para levantar uma música como esta. Mas logo depois é a vez de outro momento sublime: a cantora interpreta Woman is the nigger of the world. O faz de forma magistral. Ela não desafina e não derrapa. Tudo ao vivo. Todo o poderio da melhor voz feminina da atualidade disposta a jogar no vento tudo que o vento pode trazer de volta. Tudo que uma mulher sente por ser descriminada. Meu mundo ficaria completo não compromete e Geração Coca-cola incendeia a festa. Sem dúvida é um disco primoroso onde há muitos altos. Tantos altos que os baixos não são audíveis de tão baixos.

Thursday, February 26, 2009

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