POEMA.

prenhe de poesia
cataplasma

catapulta o poeta
sampleador

da rima

nasce o poema
e a armadilha

e dentro do alçapão
a poesia

Saturday, August 30, 2008

brincar.

1
a sinceridade das nuvens
que choram quando se encontram
comove meu olhar que transita hospedeiro
de algum azul que não tenho e quero

quando negra a manhã
açoita ainda a alvorada com espadas de sol

eu venho para brincar
com as nuvens que vejo nascer no dia
arrepiado de sombras
e sobras de cadáveres que guerrearam ontem

dizem que foram
para onde ninguém sabe onde vai quem não tem fim
aqui
ou quem tem um fim que não quis ter
pois ambos morreram na folia
e era carnaval
e se devoravam feito dois antropófagos
letrados
letárgicos
litúrgicos
se ofertando ao prazer demiurgo
de um beijo de florete ardendo entre o colo
e o reto

diziam que os índios americanos achavam que a maior humilhaçào
e pior que morrer
era verem seu cu tocado pela lança alheia
o que por muitas vezes acontecia
e fez com que milhares de índios morressem até entender
que uma bala perdida é igual a uma direcionada
e mata do mesmo jeito

2
jasmins descendo pela guela
via sangue arterial O positivo
e glóbulos
e hemácias e
leocemia a beira dos dias de fim de ano
índio de si
indiana jones e james bond e zumbi
fundando palmares nos tumores
covardes cavando covas no queixo de um morto
ou aquele afegão chutando um afegão
em rede
via televisão
ah, quanta cooperação
e eu só queria morrer na arena entre os leões
feito um gladiador suicida
pruridando sua última volúpia
arrancando os contornos das unhas
da primavera
incêndio em meu corpo e fogo no louco asilo
que velho escolho
como escopo
me esculpir do nada
as veias poluídas onde algas e fetos boiam
amalgamados pela vitrea chama
de meu cordão umbilical
vida, vida, vida, vida!
vomito tudo pra dentro de mim

Friday, August 29, 2008

CAFÉ EXPRESSO COM POESIA.

A poesia é só linguagem? Há muitos escritores que abrem mão do conteúdo em prol da linguagem e vice-versa. Talvez o mais difícil seja aliar um conteúdo apolíneo com uma forma dionisíaca. Este equilíbrio exige muito mais do poeta do que abrir mão de obter uma igualdade de forças no poema. Por isso valorizar e exaurir todas as possibilidades de uma peça poética seja o objetivo de todo o poeta. É a dificuldade de enfrentar a batalha entre essas duas aparentes dicotomias – hoje em dia – que impulsiona o bardo pós-moderno. Se tudo já foi feito, resta restaurar, religar os pólos que se apresentam como forças opostas dentro de um discurso em versos ou em poemas em prosa. Dar apenas um recado nunca aproximou nenhum artista da verdadeira arte, também amontoar palavras numa discursiva transmitindo nenhum sentido não irá levá-lo a um projeto literário sólido. A atmosfera idílica é tão importante quanto o interior da discursiva. Assim o bom poeta é aquele que consegue aliar e atrair para a sua poesia toda uma gama de aspectos que lhe propiciem alcançar o que deseja: cônscio das ferramentas necessárias para tal. Ter uma meta e partir em direção dela. Chegar a tudo aquilo que é necessário racionalmente e irracionalmente, por que não. Doses de loucura combinada com pitadas de realidade são bem-vindas a este habitat.

Neste cadinho tudo deve estar alquimicamente balanceado para que o poeta não embarque numa canoa furada e comece a encharcar seu barco poético com muitos recursos que não dirão nada a ninguém, correndo o risco de tornar-se mais um em meio à multidão e não um raro exemplo de quem sabe fazer versos inovadores e impactantes.

Pensando assim é que podemos avaliar a poesia de Greta Benitez. Ela tem o que dizer e o diz de forma inovadora e de uma maneira feminina. Também é necessário aqui afirmar que a tendência de mostrar o universo de mulher não enfraquece o trabalho da poeta, pelo contrário, mostra como funciona a mente criadora da artista em tempos de crise, em dias em que não é necessário mais debater se existe ou não escritura feminil. Aliás, este debate pode nos levar a lugares pouco interessantes. De que importa assinalar se é o escritor ou a escritora quem escreve o livro? O importante é saber se – através de seu repertório – o autor em questão consegue decolar e alçar um vôo nobre e um olhar arguto sobre os temas escolhidos ou eleitos para serem abordados em seu opúsculo.

Greta consegue e o faz de maneira ímpar mostrando que uma mulher não precisa escrever como homem e nem deve ser tratada como tal por ter uma estética forte. O conteúdo bem elaborado nos coloca em contato com um mundo onde a paixão e o amor são necessários e podem ser vistos por um olhar aguçado e exacerbado no que tange a diversas categorias do enamoramento. Desde paixões platônicas até amores perdidos em copos de cólera ou ainda desencontrados em esforços de tentá-los duradouros. Trata-se de um delicioso painel da vida romântica em dias onde vale quase tudo quando falamos da questão amorosa.

Ela lança luz sobre temas obscuros e também faz o contrário: elabora um relicário onde o desafeto conduz muitas vezes a uma solidão tão profunda quanto o sentimento de angústia tão comum nos nossos dias. Greta Benitez não está sozinha. Monta toda uma espécie de quebra-cabeça em seu Café Expresso Blackbird, que é freqüentado por uma gama de seres meticulosamente envolvidos ou ainda em desenvolvimento de afeto. A lírica amorosa é a praia da escriba que parece não se esforçar muito para colocar no papel o dia-a-dia ao qual estamos acorrentados. Benitez solta todos os grilhões e nos mostra com quanta metáfora e linguagem conotativa se faz um labor de nível alto.

Antenada com tudo de novo que está acontecendo, ela se insere numa espécie de fronteira onde o clássico e a invenção fazem detonar a mesmice que podemos encontrar em outras poéticas puramente estetistas. Não que a estética da artista fuja a noção cabralina de que um poema deve conter o necessário e nada mais que ele para alcançar patamares elevados de criatividade.

Vê-se também na autora uma forte ligação com o blues, no que tem de mais melancólica esta manifestação. Ela se ampara no canto dos negros americanos para construir seu próprio arsenal de melancolia irônica. É a fina ironia do cotidiano de bares onde os freqüentadores são seres estranhos que fazem de Café Expresso um livro muito original. Sem cair nas banalidades e com toques de sensibilidade rara vamos devorando cada um dos poemas, e é uma novidade após outra que não faz do conjunto desta obra algo desnivelado, pelo contrário: a coesão temática é que junto com o lirismo difunde o cantar blueseiro da moça. Tudo com leveza e propriedade de quem vive em Curitiba e num dos bairros onde a vida cultural e gastronômica é bastante intensa.

Engana-se quem ao dar de cara com este exemplo de poesia venha a acreditar que existe muita facilidade em concebê-la. Trata-se de um olhar todo próprio e que demanda vários recuos. Várias leituras dentro de uma leitura. É um livro intenso em sua sensualidade e erotismo. Isto sem cair no lugar comum. De um modo peculiar é traçada uma vida que muitas vezes esbarra na tristeza, mas de uma maneira sempre leve, como se a escritora se esforçasse em não criar o terror onde há espaço para celebração.

Com tudo isso, com todo este conteúdo poético, Greta Benitez se insere dentre as vozes mais criativas da poesia brasileira atual e levanta algumas questões salutares: existe ainda amor em tempos pós-modernos? Pode haver polifonia no lirismo amoroso? É possível ser simples e sofisticado ao mesmo tempo? Onde se encontra o apolíneo e o dionisíaco em doses homeopáticas e bem equilibradas?

A resposta está em Café Expresso Blackbird (Ed. Landy/2006).

Wednesday, August 27, 2008

Eu acho que estão me matando
Não acho: tenho certeza

Eu acho que tudo acaba
E o nó em minha mente desata

A morte é só mais um caminho
Para quem não tem nenhuma certeza

Já fiz das minhas e ponto
Não espero de ninguém o pranto

Sunday, August 24, 2008

CONSTATAÇÃO PRIMEIRA.

Há um colibri naquela flor
Há algemas para prender os animais?

Há camisas de força pra enforcar
E um varal cheio delas no meu quintal

E há ainda uma quinta-feira por viver
E talvez nada mais importe tanto assim

Do que o colibri naquela flor
Porque ela sabe dar e ele sabe receber

Se alguém (inclusive eu) soubesse disso
Evitaria internar alguém em um hospício

Saturday, August 23, 2008

DIAPASÃO.

Entre a tatuagem e a pele
Está a minha loucura

Às vezes se aproxima da pele
E eu me visto de louco

Vez se aproxima da tatuagem
E estou tomado de mim

Minha loucura vibra
No diapasão do corpo

Minha loucura é escriba
Sempre me imita

Sempre me irrita
Essa minha loucura

Wednesday, August 20, 2008

MACACOS.

Às vezes ele tapa o ouvido
Tapa o olho
Tapa a boca
E leva um tapa

Não quis ouvir
Não quis ver
Não quis falar

Às vezes é melhor às vezes

Monday, August 18, 2008

Eu não quero nenhum favor que te agrida
Todo mundo tem o direito de não gostar
Inclusive você. Rodrigo. E ela
Alguém me surge de repente num átimo
Ou poderia ser um simples átomo
Quem sabe alguém venha me socorrer
Talvez seja tarde demais
As angústias só se calam de manhã
Depois que como Eva e a maça
Talvez alguma massa no rosto
Venha desvendar o que digo
Mas o mundo é cheio de intrigas
E me chamo Rodrigo

Saturday, August 16, 2008

ILUSÃO DE ÓTICA.

Ela teclou comigo e me mostrou uma foto bonita. Era uma estrela. Um cometa. Uma galáxia e um furacão em forma feminina. Uma mulher bonita conquista o que quiser e geralmente, é a beleza o que mais encanta um homem. Uma cobra encantada pelo faquir. De flauta em punho e tudo. O que você gosta de fazer nas horas vagas? Quantos quilos você têm? Você gosta do Arpoador e de música? O que você gosta de ouvir? E assim depois de cada resposta precisa e uma baforada de cigarro, eu me apaixonei. Liguei pra ela. E ela disse que queria me ver (um dia) e sentir a brisa fresca da manhã abraçada a mim, perto da praia. Havia o céu e o azul e a nuvem e um monte de coisas bonitas que pensamos em fazer junto. E eu com aquela foto dela na cabeça e me masturbando enquanto fazíamos sexo virtual. Eu ligava para ela e ouvia sua voz bonita e ela me falava flores. Me dizia flores até o dia em que – sem conhecê-la – mandei flores virtuais pra ela e ela disse que não abriu as flores porque estas poderiam estar com vírus. Eu não lhe conheço direito. Não sei do que você gosta. Escolhi um tema para o nosso amor que estava apenas começando. Era uma música batida. Mas eu gosto de músicas que tocam no rádio. Gosto mais do meu passado que do meu presente e do meu futuro. Na verdade só temos o passado e eu não gosto de perder memória e o que eu vi nela além da beleza era uma coisa que me fascinava: a sua inteligência. Mulheres inteligentes e bonitas são ainda mais inteligentes e bonitas.
Às vezes penso nas estrelas, nas constelações, nos planetas. Eu cheguei a descobrir uma estrela no céu do meu quarto e batizei-a com o nome dela. Não vou dizer aqui que meu quarto tem muitas estrelas. Mas coloco uma estrela no teto toda a vez que me apaixono e fico olhando aquelas estrelas todas e as estrelas lá fora e acho as do meu quarto mais bonitas. São estrelas cativas. Não podem fazer mal a nenhum planeta. Eu sou um planeta e ela é um planeta. Às vezes sou hostil com novos planetas que orbitam a nossa existência. Fumo um cigarro e teclo com ela no computador e vejo aquela foto linda, maravilhosa e quase um pôster que queria ter no meu quarto. Sorrindo com seus dentes divinos. Com sua boca de Angelina. Com sua bunda de Beounce. Com seus olhos de Ana Paula Arósio. Que mistura intrigante era aquela mulher.
Eu andava no deserto de uma existência meio fria – apesar do calor do deserto – até encontrá-la. Tudo estava tão perdido e sem fim. Passamos a nos ligar todo o dia. Como foi seu dia? O que você me conta de novo? Com quantas metáforas se faz um poema? Qual o papel do escritor na sociedade? Sim, ela era escritora também. Formada em letras. Mestrado. Doutorado. Professora. O que eu mais queria era ela. Passei a convidá-la insistentemente para sair. Passei a freqüentar novos silêncios quando ela dizia que depois e que era cedo e que tudo nos unia e ela não escondia nada de mim. Contou que foi mãe cedo e tinha 38 anos e era uma balzaquiana e as balzaquianas são à flor do mundo para um homem e eu queria aquele encontro como tudo.
Enfim, num dia frio no Rio de Janeiro onde as pombas defecam na existência e os porcos soltam pum molhados em suas cuecas. Num dia em que parecia tudo normal. Num dia como todos os outros. Um dia que não era especial. Uma quarta-feira. Numa hora par fui me encontrar com ela no metrô aqui perto de casa. Ela disse que estaria toda de branco e viria toda linda feito à música do Jorge Bem. Eu tirei os óculos. Me achava mais bonito sem óculos e sem óculos sou meio cego. Olhei ela e só percebi que era gordinhaa. Botei os óculos e veio a decepção. Aquela linda mulher não era linda. Era uma quimera e uma sombra. Ela tinha vinte anos há mais que na foto. Beirava os 60 anos e estava detonada, talvez por uma vida difícil, talvez por ter esquecido de se cuidar e eu broxei em mim. Meu sentimento de amor deu lugar ao ódio. Tirei do coldre meu trinta e oito. Eu havia sido enganado. Havia feito sexo com uma mulher que não era aquela e talvez fosse a filha ou a vizinha ou a prostituta mais próxima. Tudo não passava de uma ilusão. Uma ilusão que fez com que começasse a chover naquele exato momento. Eu, broxa. Completamente broxa e completamente apagado e com um revólver na mão.
Não segui o conselho de um amigo mais velho que sempre me dizia que boceta não se rejeita e desferi quatro tiros nela. Era a única coisa a fazer. Ela havia me enganado. Eu que só havia dado plumas para ela, que estava apaixonado: na verdade estava apaixonado por outra mulher. Por aquela da foto.
Cheguei em casa e abri o computador e o arquivo com a foto dela e bati uma punheta gostosa. Fui gozando tão devagar quanto havia desferido os tiros nela. Depois apontei o revólver para a minha cabeça e pensei em me matar. Pensei tanto que concluí que uma boceta não se rejeita e dei um tiro na própria cabeça do meu pau.

Wednesday, August 13, 2008

CONSIDERAÇÕES SOBRE ESPAÇO E TEMPO.

Tatuagem como o enigma de uma lembrança que se repete e vira um trauma,
colada ao corpo como uma roupa de látex escura, quase-negra ou quase-branca,
decalque fácil de alguma figurinha de que me lembre quando criança,
dessas que estavam no chiclete bola e que me faziam criar uma lágrima toda a vez que explodia.
Marasmo envolto neste dia em que me lembro de lembranças que se repetem.
Alguns tatuís na mão do garoto que fui estão indo para a panela do sempre.
E estão a circular na memória passiva dos dias que virão.
Saudade é a palavra mais exata para este instante de criação. Já fui melhor em todos os sentidos vários.
Já fiz zigue-zagues imperdoável feito algumas moléculas de hidrogênio e oxigênio.
Hoje quero escrever nas águas do ontem e só apenas relembrar que fui um dia alguém.
Não sendo o nada e sendo o sempre o poeta pode olhar no espelho e não ver refletida nenhuma imagem.
Abre-se em alguma palavra alguma canção alguma nota de dez reais.
Fechado no oriente ocidental e tentando ser mais que uma quimera do hoje.
Sonâmbulos de alguma forma somos todos vampiros de emoções furtivas.
Há alguma avaria no cérebro que aqui escreve esta novidade sem novidade e
então é cair no ostracismo de mais uma manhã.
Talvez alguma estrela possa brotar do chão no céu do sol. Também esperamos que você se encontre em alguma noite dessas e feche o circulo.
Em algum idioma que não entendo minha lucidez está perdida.
Era como se eu quisesse falar as coisas que sempre falei de outras formas: na forma de um relâmpago ou da estática profunda que provoca um acordar sempre até o último dia.
Não entendo o que quis escrever, mas está escrito e se é algum enigma para mim e se o poeta não entender que estou falando dele, foda-se.
Interceder: ser ao mesmo tempo o ser e o não ser.

Monday, August 11, 2008

Há degraus de fora
Na sua coxa implume
Há abismos e ventres
Na ponta dos cabelos

Na sua coxa implume
Na ponta dos cabelos
Há abismos e ventos
Há degraus de fora

Tudo para colibri
Coibir com seu corpo
Qualquer sutileza
Ou mosca de sombra

Qualquer degrade
Que urtigue tua pele
Feito uma nuvem negra
Nunca puritana

Saturday, August 09, 2008

OLFATO.

Os acidentes do espelho e seus cacos de vidro e seus cactos que ferem e seus desertos que unem pontes podem possibilitar a mim um corte ou tornar-me alguma mulher que se movimenta despetalada nas minhas entranhas. Essa mulher sou eu no outro dia em que fui homem mastigando o delírio olfativo que um cigarro provoca: cheiro de merda.

Thursday, August 07, 2008

CATACLISMO POR TIÃO NUNES.

CATACLISMO EM BURACO NEGRO

O choque inicial provocado pela poesia de Rodrigo de Souza Leão é o embate entre o título, que sugere convulsões tremendas, e o tom quase intimista dos poemas. Basta ir ao dicionário para saber que “cataclismo” significa “grande inundação, revolta” ou ainda “convulsão social, grande desastre, derrocada”. Assim, o leitor começa sendo puxado para dentro de revoluções, sociais ou telúricas, pronto para se deparar com um Castro Alves aos berros, um Rimbaud se descabelando ou um Ginsberg clamando no deserto. Isso para ficar na poesia escrita e não procurar sarna pra coçar no mundo da música, que Rodrigo também freqüenta, onde o espetáculo exige convulsões tremendas, e quando mais tremendas, melhor.
Mas cataclismo, no caso, é outra coisa. Trata-se na verdade de uma convulsão tremenda, mas inteiramente silenciosa, instalada na cabeça do poeta, ou daquele que finge por ele, do poeta que se revela torturado. E cataclismo se torna tortura mental, a angustiante prova dos nove a que se submete o poeta em seus desvarios, obsessões, angústias.
Se cada louco é um universo fechado, podemos comparar o cérebro de um louco com o universo infinitamente maior das galáxias e buracos negros, mas não menos redundante, caótico, gratuitamente destrutivo. O pânico espreita, a morte bate à porta, as dentaduras sorriem cúmplices, o medo é uma constante. Serve de parâmetro este curtíssimo poema dedicado ao grande pintor inglês, que enxergava tempestade onde outros viam serenidade:

DENTADURA NO COPO

A Francis Bacon

Há uma escultura dentro do copo
Sorrindo pra mim

É um cataclismo intimista, freqüentemente em tom menor, lembrando a auto-ironia de Manuel Bandeira ou a aparente simplicidade de Mário Quintana. Vale dizer bem depressa, para evitar mal-entendidos, que menor, no caso, se refere ao propósito explícito do poeta por manter o ritmo baixo, por não elevar a voz, não se queixar aos gritos. Há quem prefira ser mais cantor que ator, mais Lennon que Dylan, mais Chico que Gil, para ficar entre meus contemporâneos e não ir buscar lã em berçário ou creche.

OS PSIQUIATRAS

No fundo são boas pessoas
Mas é preciso conhecê-los a fundo
Para fundá-los como amigos

Eu já tive um amigo assim
Ele conversava muito comigo
E eu gastava muito mais com cerveja

Do que dizer lá deitado no divã
Que sou uma mistura
De prozac com lexotan

É quando entram em cena os anti-heróis de Rodrigo: psiquiatras, prozac, lexotan e o resto da turma, com sua carga de terrores que todo bom maluco conhece de sobra. Enfim, essa é uma poesia do beco sem saída, da circularidade, do tentar enxergar através das brumas do invisível. Mas sempre, e olhando de banda, a morte espreita. Surpreende como Rodrigo, ao usar uma linguagem tão intimista, de palavras simples e claras, revele a profundidade da angústia que bate à porta dos cérebros em convulsão, e transforme essa simplicidade – agora sim – num cataclismo que dói fundo, e tão mais fundo quanto aparentemente mais leve.

Sebastião Nunes
Ex-poeta e eterno candidato a doido

Tuesday, August 05, 2008

VÍRUS.

Mármore
Anexado ao e-mail
Num sei quantos K bytes
E uma vírgula
Um hiato
Um sopro
E o computador foi pro espaço
E eu querendo ser astronauta
Ou voltar a pedra lascada

Alguns coturnos me cobrem de porrada
Algum urubu em sobrevôo
Tudo que eu disse virou fórmula
E a minha poesia só discorda
É uma corda
No pescoço
Que não me deixa ir
É um estilhaço na omoplata que é um beijo
Um buraco
Algumas baratas que resistirão?

Monday, August 04, 2008

Húmus do amor.

quando enquanto flor
você ainda for
seremos

Saturday, August 02, 2008

FUMAÇA.

Pedaços

De voz

Vem me dizer

Sobre nós


Alguma coisa

Está errada

Neste estilhaço


Algum maço

Fumo só


O outro os outros

berram

Friday, August 01, 2008

 
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