o infinito se inflama no crepúsculo
aos poucos a tempestade vem entupindo as artérias
de trovões elétricos
e papagaios derreiam o vento de fim de tarde
me chamo tempestade
e o cinza que irei derramar se chama nuvem
e a lágrima que irei esculpir nos telhados
se chama chuva
alguns dias são tão parecidos como hoje
que quase navego na exclamação que provoca em mim
de tanto me exclamar e declamar e declarar minha paixão pelo silêncio
e a nova porta que se fecha
para decupar o declínio de hades em mim
em mim resta a tempestade
a que sou algema que silencia o filho anti-pródigo
que vai para a prisão de seu eu
sem levar as chaves que o prendem
ao pai, a mãe, a irmã, ao irmão
e a todos que sobreviverão
ao dilúvio que virá depois da tempestade
a tempestade é só um escada para o infinito
é só um ramo no bico da pomba branca
é só uma bomba atômica explodindo todo dia dentro do quintal
e toda a vez que explode
colore o horizonte com novos fantasmas
monges que se vestem de branco
e assinam o atestado de óbito daquele que queima
seu fim na ponta de uma agulha de vagonite
costurando o aborto na manta de penélope
desfazendo os sapatinhos do neném
alguém um dia lembrará
que os irmãos marxs só fizeram catapultar
e quem vôo foi mesmo santos dummont
e que claudio manuel da costa era maior mesmo de joelhos
do que o teto onde dizem que plantou uma forca
e que gaudino não queimou por brincadeira
algum dia como este dia que se chama tempestade
trará de súbito
uma tara pela vida
transaremos na chuva infinita de nossas salivas
esbugalhadas em olhos perdidos
e brincaremos de autorama
eu e meu filho e eu e meu pai
ah, são marcelo
como pode dar sua vida por outro homem?
como pode, por ouvir vozes
construir em si algo tão perfeito
como uma catedral de espelhos que não se refletiam
mas refletiam todo o amor que tinha para com o outro
ah, são marcelo
por que deus não vive em mim assim?
algum dia como este dia em que a tempestade se encolheu
agora quase às três da tarde
recolhi os cacos de minha existência
e tentei construir um poema
envolto no oitavo cigarro
no sexto andar
no milhão de madalas turvas
que formam o contorno do meu rosto
dissipando-se nas trevas de um acorde menor
nas grandes grades mãos da divina deusa
que me interrompe no piano de caudas do vestido de clarice
chopin
clarice chopin.
Posted by Rodrigo de Souza Leão at 9:19 AM
2 Comments:
mano, como tá?
gostei pacas daquele lá embaixo "dentro e fora / cimento de aurora".
tás produzindo bastante, hein?
e o livro, qdo sai?
abração
tempestade mais forte de tarde
quando a vida se apaga jenta
e escada pro infinito
e esse infinito no seu esqueleto
e você cada vez mais Clarice
cada vez maior no do re mi fa sol
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